quarta-feira, 28 de abril de 2010

Código Ambiental: 90% dos produtores descumprem lei

LILIAN MILENA

Da Redação - ADV

Agropecuaristas querem reforma do Código Florestal Nacional alegando
incompatibilidade das regras federais à realidade do produtor
brasileiro. A Comissão Especial, que analisa as diretrizes, se reúne
esta terça-feira (27) para definir o cronograma de trabalho das
discussões.

Os reformistas estimam que 90% dos produtores brasileiros transgridem
de alguma forma a Lei nº 4.771/65, o que significa 5 milhões de
pessoas. Segundo o deputado federal, e relator da proposta de reforma,
Aldo Rebelo (PCdoB-SP), a alta taxa de fazendeiros que não se adéquam
às regras ambientais é motivo suficiente para revisão das diretrizes
nacionais de conservação e preservação de biomas.

Em contrapartida, ambientalistas reforçam a necessidade de se manter a
proteção de áreas de mananciais, encostas e florestas, considerando os
benefícios indiretos à economia agrícola e seus impactos sobre o clima
local. André Lima, coordenador de Políticas Públicas do Instituto de
Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), lembra que os últimos desastres
ambientais sofridos pelas populações dos estados de Santa Catarina,
São Paulo e Rio de Janeiro foram resultados da combinação de fenômenos
hidrológicos e desrespeito à legislação ambiental.

O porta-voz do IPAM alega que não existem estudos confiáveis de que
90% dos produtores, em todo o Brasil, não cumprem as diretrizes do
Código Florestal. Lima concorda que as diretrizes federais podem ser
aprimoradas, mas no sentido de aumentar a proteção dos recursos
hídricos e da biodiversidade. Já em relação às regiões do país que
mais sofreram perdas da sua biodiversidade (Sul e Sudeste), o
ecologista aponta que há alternativas sustentáveis como a reposição de
florestas perdidas além das propriedades.

Os reformistas querem que as áreas de proteção permanente (APP) e as
reservas legais (RL), tenham territórios limitados abaixo do
estabelecido pelo código federal. As APP são espaços com vegetação
nativa, essenciais para conter processos de erosão ao longo de rios e
mananciais. São classificadas junto aos corpos hídricos em geral,
nascentes, topos de morros nas montanhas, serras, encostas e
restingas. Proprietários de áreas classificadas como APP não podem
alterá-las.

O limite mínimo de corredores marginários ao longo do curso de águas,
reservatórios e nascentes, além do limite das cheias anuais, por
exemplo, é de 30 metros. Logo, toda pessoa que tiver terreno em área
de manancial não pode produzir culturas, criar gado ou construir nessa
faixa.

Já as Reservas Legais são estabelecidas em toda e qualquer propriedade
rural. O Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) avalia que a RL
garante a conservação e reabilitação dos processos ecológicos e
conservação da biodiversidade. A cobertura vegetal seria responsável
por benefícios econômicos indiretos como amenização de cheias e da
erosão, regulação do clima local, controle de pragas e proteção dos
rios.

A lei determina que proprietários em áreas de Mata Atlântica mantenham
20% da cobertura vegetal original – se estiverem desmatadas, o dono do
terreno terá que replantar os 20%. Proprietários no Cerrado devem
proteger 35% do bioma, e na Amazônia, o índice mínimo de preservação é
de 80%.

Os ruralistas propõem redução na Amazônia dos atuais 80% para 50%
(alguns até mesmo para 20%), e no Cerrado, dos atuais 35% para 20%,
como o estabelecido na Mata Atlântica.

Jean Paul Metzger, biólogo e ecologista do Instituto de Biociência da
USP, destaca que simulações e pesquisas em campo, realizadas em
diferentes áreas preservadas, apontam que para garantir o equilíbrio
de espécies da flora e fauna e a interação delas ao ambiente, cerca de
60% da paisagem original deve ser preservada em qualquer bioma.

“Apesar deste valor ter sido definido para paisagens aleatórias,
estudos considerando três padrões distintos de fragmentação na
Amazônia sustentam a ocorrência de mudanças bruscas em valores
próximos a 60%”, completa em seu artigo onde discute as bases
científicas do Código Florestal.

Segundo o biólogo se as APP estiverem entre 10% e 20%, as RL devem ser
de pelo menos 50%, ou mais de 60%. A consolidação dessas paisagens em
grandes espaços, e/ou interligadas por corredores verdes, garante a
conservação da biodiversidade e seus benefícios as atividades humanas,
assim como controle do clima local.

Em relação aos corredores junto aos cursos hídricos, as pesquisas
apontam para uma área superior aos 60 metros (30 metros de cada lado
do rio) estipulados pela lei federal. Os valores mínimos deveriam ser
de 50 metros para cada margem, independente do tipo de bioma. A
manutenção de 30 metros resulta na conservação de apenas 60% das
espécies locais.

Os reformistas querem incluir as APP no cômputo das RL. A legislação
prevê a proteção de 20% da Mata Atlântica num determinado território,
isso é, considerando apenas as reservas legais. A exigência é para que
as áreas de proteção permanentes se somem às porcentagens de reservas
legais, em âmbito regional.

Para os ambientalistas RL e APP se complementam. Enquanto a primeira
visa a conservação da biodiversidade e uso sustentável de recursos
naturais, a segunda tem função de preservar recursos hídricos,
paisagens, além de garantir estabilidade geológica em morros e biomas
típicos de matas ciliares. Portanto seria um erro ecológico considerá-
las equivalentes.

Outro ponto da reforma que não tem agradado nem um pouco os
ecologistas é a proposta de transformar o Conselho Nacional do Meio
Ambiente, o CONAMA, num órgão consultor técnico. Atualmente o
Conselho, do Ministério do Meio Ambiente, é consultivo e deliberativo,
composto por representantes de cinco setores: da federação, estados,
municípios, do setor empresarial e da sociedade civil.

O CONAMA ajuda a estabelecer medidas propostas pelo IBAMA e demais
entidades que integram o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA),
ou seja, normas e critérios para o licenciamento de atividades de
impacto ambiental em todo o país. E, para os ecologistas, a
transformação do Conselho em uma instituição apenas consultiva tende a
tornar as discussões menos democráticas.

“A transformação do CONAMA num órgão consultivo é um retrocesso
secular. O Conselho é uma conquista da sociedade com participação
direta de diferentes setores, incluindo agricultores, madeireiros,
estados, municípios e ONGs. Essa estrutura tem auxiliado no
engajamento para o cumprimento das normas ambientais”, defende André
Lima.

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