sexta-feira, 25 de junho de 2010

Inventário aponta emissão de quase 89 milhões de toneladas de gases estufa Marli Moreira, da Agência Brasil

Repórter Diário - 22/06/2010

Inventário aponta emissão de quase 89 milhões de toneladas de gases estufa
Marli Moreira, da Agência Brasil

Levantamento inédito no Brasil aponta que em 2009 um grupo de 35
grandes empresas, que representa 4% do total de emissões no País, foi
responsável pela emissão de quase 89 milhões de toneladas de gás
carbônico (CO2) equivalente. De acordo com o levantamento, a indústria
de transformação lidera em emissões com 89%, seguida pelo setor de
mineração (10%).

Os dados fazem parte do Inventário Registro Público de Emissões de
Gases de Efeito Estufa, lançado nesta terça-feira (22/06), em São
Paulo, com a presença da ministra do Meio Ambiente, Isabella Teixeira.

O levantamento foi feito sob a coordenação do Centro de Estudos em
Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas (Gvces), em parceria com o
World Resources Institute (Instituto Mundial de Recursos), organização
norte-americana que foi a primeira a formular ferramentas de gestão
para a economia de baixo carbono.

Para o coordenador do Centro de Estudos de Sustentabilidade (GVces),
mantido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), Mário Monzoni, a
transparência desse grupo de empresas, que resolveu divulgar a
quantidade de emissão de gases que causam o efeito estufa, significa
“um passo de excelência empresarial de um movimento grande de
sustentabilidade”.

A expectativa dele é que o número de empresas participantes cresça a
cada ano. Entre as companhias integrantes do inventário estão a
Petrobras, o Banco do Brasil, a Alcoa, Ambev, Furnas Centrais
Elétricas, Natura e Souza Cruz.

As ações do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getulio
Vargas fazem parte do programa internacional de normas de gestão
ambiental, o GHG Protocol, integrado à Política Nacional de Clima e ao
cumprimento da meta estabelecida na Conferência das Nações Unidas
sobre Mudanças Climáticas (COP-15), ocorrida em Copenhague, em
dezembro do ano passado.

Para a ministra do Meio Ambiente, Isabella Teixeira, a iniciativa vai
ajudar no “processo de discussão da Política Nacional de Mudança
Climática”. Ela lembrou que os países desenvolvidos já adotam esse
tipo de gestão ambiental transparente.

Os dados do levantamento podem ser acessados por meio do endereço
eletrônico "www.fgv.br/ces/registro".

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Longe do Golfo, vazamento de petróleo na Nigéria dura 50 anos



Estimativas apontam que Delta do Níger sofre o equivalente a um Exxon Valdez por ano

Grandes vazamentos de petróleo deixaram de ser notícia em Bodo, na Nigéria. O Delta do Níger, onde a riqueza subterrânea contrasta com a pobreza existente na superfície, tem sofrido o equivalente ao vazamento do Exxon Valdez a cada ano nos últimos 50 anos, segundo algumas estimativas. O petróleo vaza quase todas as semanas e alguns pântanos já não têm vida há muito tempo.

Talvez nenhum outro lugar na Terra tenha sido tão maltratado pelo petróleo, dizem os especialistas, o que deixa os moradores de Bodo espantados com a atenção ininterrupta dada ao vazamento a meio mundo de distância, no Golfo do México. Foi apenas há algumas semanas, eles dizem, que um cano da Royal Dutch Shell que estourou nos manguezais foi finalmente fechado, após dois meses de vazamento contínuo: agora nenhum ser vivo se move numa área tomada pelo petróleo e que antes era repleta de camarões e caranguejos.

Foto: The New York Times

Mulher caminha em meio a rio poluído em Kegbara Dere, na Nigéria

Não muito longe dali, ainda há petróleo cru no Riacho Gio de um vazamento que aconteceu em abril. Do outro lado da fronteira do Estado, em Akwa Ibom, os pescadores amaldiçoam suas redes enegrecidas pelo petróleo, inúteis em um mar estéril por causa de um vazamento de um oleoduto marítimo da Exxon Mobil em maio, que durou semanas.

O petróleo vaza de tubulações enferrujadas e envelhecidas, não controladas pelo que os especialistas dizem ser uma regulamentação ineficaz ou corrupta, e é auxiliado por uma manutenção deficiente e por sabotagens constantes. Diante desta maré negra existem raros protestos - soldados que guardavam uma sede da Exxon Mobil bateram em mulheres que protestavam na frente do prédio no mês passado, segundo testemunhas -, mas principalmente uma aceitação ressentida.

Aqui, as crianças pequenas nadam no estuário poluído, os pescadores levam seus esquifes cada vez mais longe - "Não há nada que possamos pescar aqui", disse Pio Doron, em seu barco - e as mulheres do mercado andam com dificuldade por riachos cheios de petróleo.

"Há petróleo Shell no meu corpo", disse Hannah Baage, emergindo do Riacho Gio com um facão para cortar os caules de mandioca equilibrados sobre a sua cabeça.

Que o acidente no Golfo do México tenha paralisado um país e um presidente que tanto admiram é algo que espanta as pessoas aqui, que vivem entre os estuários em condições tão abjetas quanto em qualquer outra região da Nigéria, de acordo com as Nações Unidas. Apesar de sua região contribuir com cerca de 80% da receita do governo, eles pouco se beneficiam disso: a expectativa de vida é a menor do país.

"O presidente Obama está preocupado com aquele", disse Claytus Kanyie, um oficial local, sobre o vazamento do Golfo, em pé entre os mangues mortos na lama mole e oleosa de Bodo. "Ninguém está preocupado com este. A vida aquática do nosso povo está morrendo. Antes tínhamos camarão. Não há mais nenhum camarão".

À distância, avista-se a fumaça que Kanyie e ativistas ambientais dizem ser de uma refinaria ilegal mantida por ladrões de petróleo locais e protegidas, segundo eles, pelas forças de segurança nigerianas. O pântano estava deserto e tranquilo, sem nem mesmo o canto dos pássaros; antes do vazamento, disse Kanyie, as mulheres de Bodo ganhavam a vida recolhendo moluscos e crustáceos que viviam entre os manguezais.

Com as novas estimativas de que mais de 2,5 milhões de galões de petróleo podem vazar no Golfo do México por dia, o Delta do Níger passou a ser uma história com a qual os Estados Unidos podem aprender.

Até 546 milhões de galões de petróleo foram derramados no Delta do Níger nas últimas cinco décadas, ou quase 11 milhões de galões por ano, concluiu um relatório de 2006 feito por uma equipe de especialistas do governo da Nigéria e de grupos ambientalistas locais e internacionais . Em comparação, o vazamento do Exxon Valdez em 1989 despejou cerca de 10,8 milhões de galões de petróleo nas águas do Alasca.

Assim, o povo aqui lança um olhar invejoso, ainda que simpatizante, ao vazamento no Golfo Pérsico. "Lamentamos por eles, mas isso está acontecendo aqui há 50 anos", disse Emman Mbong, um oficial de Eket.

Os vazamentos na Nigéria são ainda mais devastadores, porque esta região ecologicamente sensível das zonas úmidas, fonte de 10% das importações de petróleo dos Estados Unidos, tem a maior parte do mangue da África e, como a costa da Louisiana, tem alimentado o interior durante gerações com sua abundância de peixes, crustáceos, fauna e plantações.

Ambientalistas locais vêm denunciando a devastação há muitos anos, com poucos resultados.

"É um ambiente morto", disse Patrick Naagbanton do Centro para Meio Ambiente, Direitos Humanos e Desenvolvimento, em Port Harcourt, a principal cidade da região do petróleo.

Embora muito tenha sido destruído, ainda há grandes extensões de um verde vibrante. Os ambientalistas dizem que com uma recuperação intensiva, o Delta do Níger poderia voltar a ser o que era.

A Nigéria produziu mais de 2 milhões de barris de petróleo por dia no ano passado, e em mais de 50 anos milhares de quilômetros de tubulações foram colocadas através dos pântanos. A Shell, principal companhia na área, tem operações em milhares de quilômetros quadrados de território, de acordo com a Anistia Internacional. Colunas envelhecidas de poços de petróleo, conhecidas como árvores de Natal, surgem improváveis em clareiras entre as palmeiras. O petróleo muitas vezes jorra por elas mesmo que os poços estejam extintos.

"O petróleo estava simplesmente jorrando pelo ar, até o céu", disse Amstel M. Gbarakpor, presidente da juventude em Kegbara Dere, recordando o derramamento de abril no Riacho Gio. "Foram necessárias três semanas para fechar este poço".

Quantos dos vazamentos são causados por ladrões de petróleo ou sabotagem ligada ao movimento militante ativo no Delta do Níger, e quantos decorrem da falta de manutenção e tubos envelhecidos, são questões que envolvem uma disputa acirrada entre as comunidades, os ambientalistas e as empresas de petróleo.

Caroline Wittgenstein, porta-voz da Shell em Lagos, disse: "Nós não discutimos vazamento individuais", mas ela argumentou que a "vasta maioria" é causada por sabotagem ou roubo, com apenas 2% devido à falha de equipamento ou erro humano.

"Nós não acreditamos que nos comportamos de forma irresponsável, mas operamos em um ambiente único onde a segurança e a ilegalidade são os maiores problemas", disse Wittgenstein.

As empresas petrolíferas também alegam que limpam muito do material que é vazado. Um porta-voz da Exxon Mobil em Lagos, Nigel A. Cookey-Gam, disse que o vazamento recente da empresa foi de cerca de 8.400 galões e que "tudo isso foi efetivamente limpo".

Mas muitos especialistas e autoridades locais dizem que as empresas atribuem excessiva culpa à sabotagem, para diminuir sua responsabilidade. Ricardo Steiner, consultor de vazamentos de petróleo, concluiu num relatório de 2008 que, historicamente, "o índice de falhas nos oleodutos na Nigéria é muitas vezes maior que aquele encontrado em outras partes do mundo", e ele observou que mesmo a Shell reconheceu que "quase todos os anos" um vazamento pode ser ligado a um oleoduto corroído.

Na praia de Ibeno, os poucos pescadores parecem taciturnos. Mar adentro, o petróleo tem vazado há semanas de uma tubulação da Exxon Mobil. "Nós não conseguimos ver onde pescar, o petróleo está no mar", disse Patrick Okoni.

Por Adam Nossiter


The New York Times | 17/06/2010 15:51

sábado, 19 de junho de 2010

Comico desastre

Depois das sátiras sobre o não reflorestamento das mudas do Rodoanel
agora é um momento cômico do desastre no Golfo
é so entrar no link abaixo


http://www.youtube.com/watch?v=1YeFgYJPvvg&feature=player_embedded#!

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Ministra do Meio Ambiente critica mudanças no Código Florestal

Por Câmara dos Deputados

A ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, criticou nesta quarta-feira (9/6) as mudanças no Código Florestal que estão sendo discutidas na Câmara. Segundo ela, as mudanças previstas nas áreas de reserva legal podem ir na contramão de metas internacionais das quais o Brasil é signatário. A ministra pediu que os parlamentares examinem os tratados internacionais de meio ambiente já assinados pelo Brasil. O relator das mudanças no Código Florestal (Projeto de Lei 1876/99 e apensados), deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), retira a obrigatoriedade de reserva legal para pequenas propriedades e exclui os topos de morro das Áreas de Preservação Permanente (APPs), entre outras modificações.

Para Izabella, os agricultores podem manter a reserva legal e ainda assim produzir mais, sem desmatamento ou perda de vegetação nativa. "Não acho que, para avançar na produção agrícola, temos que desmatar mais. É preciso entender onde estão as áreas produtivas do país e qual é o papel da reserva legal e da APP na proteção da biodiversidade. Estudos da Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), da USP, mostram que as APPs e a reserva legal desempenham um papel de conservação da biodiversidade mais do que o dobro do desempenhado pelas áreas protegidas e pelas terras indígenas", disse.

Em audiência na Comissão de Meio Ambiente, ela informou que o Brasil vai defender, na 10ª Conferência das Partes da Convenção da Biodiversidade das Nações Unidas (COP 10), a disponibilização dos recursos necessários para que a perda de biodiversidade do planeta seja eliminada a partir de 2020. Segundo a ministra, existem mais recursos para a convenção sobre mudanças climáticas do que para a preservação da biodiversidade. A COP 10, que é realizada a cada dois anos, vai ocorrer em outubro, no Japão.

Izabella disse que também está em jogo na COP-10 a aprovação de um protocolo internacional sobre o acesso aos recursos genéticos para que as legislações nacionais nessa área sejam reconhecidas. O protocolo seria um meio de evitar a biopirataria e remunerar os países que detêm o patrimônio genético usado em vários produtos. Ela informou que em breve o Executivo enviará projeto de lei ao Congresso sobre o tema.

O presidente da Comissão de Meio Ambiente, deputado Jorge Khoury (DEM-BA), fez um apelo à ministra para que o projeto seja enviado logo para o Congresso. O deputado lembrou que este é o Ano Internacional da Biodiversidade. "Uma medida provisória em vigor é o único instrumento que temos, e está totalmente superada em função dos avanços tecnológicos e científicos. Há necessidade de buscar uma legislação mais apropriada. Já houve entendimento dos ministérios da Ciência e Tecnologia e do Meio Ambiente com relação aos ajustes necessários, mas essa legislação ainda está na Casa Civil", afirmou.

O representante do Ministério da Ciência e Tecnologia, Ricardo Melamed, ao comentar os trabalhos sobre biodiversidade vegetal, disse que os Estados Unidos têm catalogadas mais de 60 milhões de espécies vegetais, enquanto o Brasil só conta com 10% disso em suas coleções.

Câmara dos Deputados/EcoAgência
Paulo A. Pizzi
Presidente
MATER NATURA - Instituto de Estudos Ambientais
Rua Lamenha Lins, 1080 - Bairro Rebouças
Cep 80250-020 - Curitiba - Paraná - Brasil
E-mail: pizzi@maternatura.org.br
Site: www.maternatura.org.br

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Movimentos sociais protestam contra criação do novo Código Florestal Da Agência Brasil

Ambientalistas e representantes de movimentos sociais se reuniram
nesta semana em frente a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro
(Alerj), para um ato contra o novo Código Florestal, em discussão no
Congresso Nacional. Eles afirmam que a medida vai prejudicar a
agricultura familiar e destruir as áreas de Preservação Permanente
(APP).

“Mais alimento e menos desmatamento”, defendem os ambientalistas e
agricultores familiares que participaram da manifestação. Agricultores
familiares afirmam que a nova lei não vai beneficiar os pequenos
agricultores. “A agricultura familiar vai ser prejudicada diretamente
pela própria expansão do agronegócio sobre as terras desmatadas e
sobre as áreas da agricultura familiar”, disse Fernando Moura, do
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

Os movimentos sociais Via Campesina, MST e os representantes dos
agricultores familiares que participaram do ato disseram que a
proteção ambiental não prejudica a agricultura familiar. “Essa nova
proposta vai facilitar o desmatamento, vai dificultar a proteção dos
rios e das florestas e ainda permitir a expansão do agronegócio nessas
áreas desmatadas. Essa proposta é um imenso retrocesso. Se for
aprovada, vai trazer imensos problemas do ponto de vista climático e
no equilíbrio ecológico e vai dobrar o desmatamento no país. Além
disso, o Brasil não vai poder diminuir em 39% o desmatamento, como
acertou no Acordo de Copenhague”, disse Moura.

O representante da organização não governamental (ONG) Greenpeace,
Paulo Adário, afirmou que o deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), relator
da proposta de alteração do Código Florestal na comissão especial
criada pela Câmara dos Deputados, acredita que o desmatamento irá
promover o crescimento do país. “A nova proposta permitirá o
esquartejamento do Código Florestal, ela abriu uma brecha para acabar
com a reserva legal e com as APP. Ele [Rebelo] acredita que quem
preservar é contra o desenvolvimento do país. Nós sabemos que não
precisa desmatar para o Brasil crescer.”

Segundo o representante da ONG SOS Mata Atlântica, Mario Mantovani, a
quantidade de terras já desmatadas é o suficiente para a produção e
expansão da agricultura. “Estudos comprovam que o que já existe de
área aberta poderia produzir três ou quatro vezes mais”, disse
Mantovani.

domingo, 13 de junho de 2010

Crise ecológica, capitalismo, altermundialismo:um ponto de vista ecossocialista

Os ecologistas se enganam se crêem poder abrir mão da crítica de Marx ao capitalismo: uma ecologia que não leve em conta a relação entre “produtivismo” e lógica do lucro está destinada ao fracasso – ou pior, à sua recuperação pelo sistema. Os exemplos não faltam... A ausência de uma postura anticapitalista coerente levou a maior parte dos partidos verde europeus – França, Alemanha, Itália, Bélgica – a tornar-se simples parceiro “ecoreformista” da gestão social-liberal do capitalismo pelos governos de centro-esquerda. O artigo é de Michael Löwy e integra o n° 14 da revista Margem Esquerda.

Michael Löwy

Apresentação e sumário da revista Margem Esquerda, n° 14.

Grandezas e limites da ecologia
A grande contribuição da ecologia foi e continua sendo nos fazer tomar consciência dos perigos que ameaçam o planeta como consequência do atual modelo de produção e consumo. O crescimento exponencial das agressões ao meio ambiente e a ameaça crescente de uma ruptura do equilíbrio ecológico configuram um quadro catastrófico que coloca em questão a própria sobrevivência da vida humana. Estamos diante de uma crise de civilização que exige mudanças radicais.

Os ecologistas se enganam se crêem poder abrir mão da crítica marxiana do capitalismo: uma ecologia que não leve em conta a relação entre “produtivismo” e lógica do lucro está destinada ao fracasso – ou pior, à sua recuperação pelo sistema. Os exemplos não faltam... A ausência de uma postura anticapitalista coerente levou a maior parte dos partidos verde europeus – França, Alemanha, Itália, Bélgica – a tornar-se simples parceiro “ecoreformista” da gestão social-liberal do capitalismo pelos governos de centro-esquerda.

Considerando os trabalhadores irremediavelmente destinados ao produtivismo, alguns ecologistas ignoram/descartam o movimento operário e inscrevem em suas bandeiras: “nem esquerda, nem direita”.

Ex-marxistas convertidos à ecologia declaram apressadamente “adeus à classe operária” (André Gorz), enquanto outros autores (Alain Lipietz) insistem na necessidade de abandonar o “vermelho” – isto é, o marxismo ou o socialismo – para aderir ao “verde”, novo paradigma que trará uma resposta a todos os problemas econômicos e sociais.

O ecossocialismo
O que é então o ecossocialismo? Trata-se de uma corrente de pensamento e ação ecológicos que toma como suas as aquisições fundamentais do marxismo – ao mesmo tempo que se livra de seus entulhos produtivistas.

Para os ecossocialistas a lógica do mercado e do lucro – bem como aquela do defunto do autoritarismo burocrático, o “socialismo real” – são incompatíveis com as exigências de preservação do meio ambiente. Ao mesmo tempo que criticam a ideologia das correntes dominantes do movimento operário, eles sabem que os trabalhadores e suas organizações são uma força essencial para uma transformação radical do sistema e para a construção de uma nova sociedade socialista e ecológica.

Essa corrente está longe de ser politicamente homogênea, mas a maior parte de seus representantes compartilha alguns temas. Rompendo com a ideologia produtivista do progresso – em sua forma capitalista e/ou burocrática – e oposta à expansão ao infinito de um modo de produção e consumo destruidor da natureza, o ecossocialismo representa uma tentativa original de articular as ideias fundamentais do socialismo marxista com as contribuições da crítica ecológica.

O raciocínio ecossocialista se apoia em dois argumentos essenciais:

1) o modo de produção e consumo atual dos países capitalistas avançados, fundado sobre uma lógica de acumulação ilimitada (do capital, dos lucros, das mercadorias), desperdício de recursos, consumo ostentatório e destruição acelerada do meio ambiente, não pode de forma alguma ser estendido para o conjunto do planeta, sob pena de uma crise ecológica maior. Segundo cálculos recentes, se o consumo médio de energia dos EUA fosse generalizado para o conjunto da população mundial, as reservas conhecidas de petróleo seriam esgotadas em 19 dias. Esse sistema está, portanto, necessariamente fundado na manutenção e agravamento da desigualdade entre o Norte e o Sul;

2) de qualquer maneira, a continuidade do “progresso” capitalista e a expansão da civilização fundada na economia de mercado – até mesmo sob esta forma brutalmente desigual – ameaça diretamente, a médio prazo (toda previsão seria arriscada), a própria sobrevivência da espécie humana, em especial por causa das consequências catastróficas da mudança climática.

A racionalidade limitada do mercado capitalista, com seu cálculo imediatista das perdas e lucros, é intrinsecamente contraditória com uma racionalidade ecológica, que leve em conta a temporalidade longa dos ciclos naturais.

Não se trata de opor os “maus” capitalistas ecocidas aos “bons” capitalistas verdes: é o próprio sistema, fundado na competição impiedosa, nas exigências de rentabilidade, na corrida pelo lucro rápido, que é destruidor dos equilíbrios naturais. O pretenso capitalismo verde não passa de uma manobra publicitária, uma etiqueta buscando vender uma mercadoria, ou, no melhor dos casos, uma iniciativa local equivalente a uma gota-d’água sobre o solo árido do deserto capitalista.

Contra o fetichismo da mercadoria e a autonomização reificada da economia pelo neoliberalismo, o que está em jogo no futuro para os ecossocialistas é pôr em prática uma “economia moral” no sentido dado por Edward P. Thompson a este termo, isto é, uma política econômica fundada em critérios não monetários e extraeconômicos: em outras palavras, a reconciliação do econômico no ecológico, no social e no político.

As reformas parciais são totalmente insuficientes: é preciso substituir a microrracionalidade do lucro pela macrorracionalidade social e ecológica, algo que exige uma verdadeira mudança de civilização . Isso é impossível sem uma profunda reorientação tecnológica, visando a substituição das fontes atuais de energia por outras não poluentes e renováveis, como a eólica ou solar . A primeira questão colocada é, portanto, a do controle sobre os meios de produção e, principalmente, sobre as decisões de investimento e transformação tecnológica, que devem ser arrancados dos bancos e empresas capitalistas para tornarem-se um bem comum da sociedade.

Certamente, a mudança radical se relaciona não só com a produção, mas também com o consumo. Entretanto, o problema da civilização burguês-industrial não é – como muitas vezes os ecologistas argumentam – “o consumo excessivo” pela população e a solução não é uma “limitação” geral do consumo, sobretudo nos países capitalistas avançados. É o tipo de consumo atual, fundado na ostentação, no desperdício, na alienação mercantil, na obsessão acumuladora, que deve ser colocado em questão.

Ecologia e altermundialismo
Sim, nos responderão, é simpática essa utopia, mas por enquanto é preciso ficar de braços cruzados? Certamente não! É preciso lutar por cada avanço, cada medida de regulamentação, cada ação de defesa do meio ambiente. Cada quilômetro de estrada bloqueado, cada medida favorável aos transportes coletivos é importante; não somente porque retarda a corrida em direção ao abismo, mas porque permite às pessoas, aos trabalhadores, aos indivíduos se organizar, lutar e tomar consciência do que está em jogo nesse combate, de compreender, por sua experiência coletiva, a falência do sistema capitalista e a necessidade de uma mudança de civilização.

É nesse espírito que as forças mais ativas da ecologia estão engajadas, desde o início, no movimento altermundialista. Tal engajamento corresponde à tomada de consciência de que os grandes embates da crise ecológica são planetários e, portanto, só podem ser enfrentados por uma démarche resolutamente cosmopolítica, supranacional, mundial. O movimento altermundialista é sem dúvida o mais importante fenômeno de resistência antisistêmica do início do século XXI.

Essa vasta nebulosa, espécie de “movimento dos movimentos” que se manifesta de forma visível nos Fóruns Sociais – regionais e mundiais – e nas grandes manifestações de protesto – contra a Organização Mundial do Comércio (OMC), o G8 ou a guerra imperial no Iraque – não corresponde às formas habituais de ação social ou política. Ampla rede descentralizada, ele é múltiplo, diverso e heterogêneo, associando sindicatos operários e movimentos camponeses, ONGs e organizações indígenas, movimentos de mulheres e associações ecológicas, intelectuais e jovens ativistas. Longe de ser uma fraqueza, essa pluralidade é uma das fontes da força, crescente e expansiva, do movimento.

Pode-se afirmar que o ato de nascimento do altermundialismo foi a grande manifestação popular que fez fracassar a reunião da OMC em Seattle, em 1999. A cabeça visível desse combate era a convergência surpreendente de duas forças: turtles and teamsters, ecologistas vestidos de tartarugas (espécie ameaçada de extinção) e sindicalistas do setor de transportes. Portanto, a questão ecológica estava presente, desde o início, no coração das mobilizações contra a globalização capitalista neoliberal. A palavra de ordem central desse movimento, “o mundo não é uma mercadoria”, visa também, evidentemente, o ar, a água, a terra, isto é, o ambiente natural, cada vez mais submetido aos ditames do capital.

Podemos afirmar que o altermundialismo comporta três momentos: 1) o protesto radical contra a ordem existente e suas sinistras instituições: o FMI, o Banco Mundial, a OMC, o G8; 2) um conjunto de medidas concretas, propostas passíveis de serem imediatamente realizadas: a taxação dos capitais financeiros, a supressão da dívida do Terceiro Mundo, o fim das guerras imperialistas; 3) a utopia de um “outro mundo possível”, fundado sobre valores comuns como liberdade, democracia participativa, justiça social e defesa do meio ambiente.

A dimensão ecológica está presente nesses três momentos: ela inspira tanto a revolta contra um sistema que conduz a humanidade a um trágico impasse, quanto um conjunto de propostas precisas – moratória sobre os OGMs (Organismos Geneticamente Modificados), desenvolvimento de transportes coletivos gratuitos –, bem como a utopia de uma sociedade vivendo em harmonia com os ecossistemas, esboçada pelos documentos do movimento. Isso não quer dizer que não existam contradições, fruto tanto da resistência de setores do sindicalismo às reivindicações ecológicas, percebidas como uma “ameaça ao emprego”, quanto da natureza míope e pouco social de algumas organizações ecológicas. Mas uma das características mais positivas dos Fóruns Sociais, e do altermundialismo em seu conjunto, é a possibilidade do encontro, debate, diálogo e da aprendizagem recíproca de diferentes tipos de movimentos.

É preciso acrescentar que o próprio movimento ecológico está longe de ser homogêneo: é muito diverso e contem um espectro que vai desde ONGs moderadas habituadas ao lobby como forma de pressão, até os movimentos combativos inseridos num trabalho de base militante; da gestão “realista” do Estado (no nível local ou nacional) às lutas que colocam em questão a lógica do sistema; da correção dos “excessos” da economia de mercado às iniciativas de orientação ecossocialista.

Essa heterogeneidade caracteriza, diga-se de passagem, todo o movimento altermundialista, mesmo com a predominância de uma sensibilidade anticapitalista, sobretudo na América Latina. É a razão pela qual o Fórum Social Mundial, precioso lugar de encontro – como explica tão bem nosso amigo Chico Whitaker – onde diferentes iniciativas podem fincar raízes, não pode se tornar um movimento sociopolítico estruturado, com uma “linha” comum, resoluções adotadas por maioria etc.

É importante sublinhar que a presença da ecologia no “movimento dos movimentos” não se limita às organizações ecológicas – Greenpeace, WWF, entre outras. Ela se torna cada vez mais uma dimensão levada em conta, na ação e reflexão, por diferentes movimentos sociais, camponeses, indígenas, feministas, religiosos (Teologia da Libertação).

Um exemplo impressionante dessa integração “orgânica” das questões ecológicas por outros movimentos é o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) que, com seus camaradas da rede internacional Via Campesina, é um dos pilares do Fórum Social Mundial e do movimento altermundialista. Hostil desde sua origem ao capitalismo e sua expressão rural, o agronegócio, o MST integrou cada vez mais a dimensão ecológica no seu combate por uma reforma agrária radical e um outro modelo de agricultura. Durante a celebração do vigésimo aniversário do movimento, no Rio de Janeiro em 2005, o documento dos organizadores declarava: nosso sonho de “um mundo igualitário, que socialize as riquezas materiais e culturais”, um novo caminho para a sociedade, “fundado na igualdade entre os seres humanos e nos princípios ecológicos”.

Isto se traduziu nas ações – por diversas vezes à margem da “legalidade” – do MST contra os OGMs, o que é tanto um combate contra a tentativa das multinacionais – Monsanto, Syngenta – de controlar totalmente as sementes, submetendo os camponeses à sua dominação, como uma luta contra um fator de poluição e contaminação incontrolável do campo. Assim, graças a uma ocupação “selvagem”, o MST obteve em 2006 a expropriação do campo de milho e soja transgênicos da Syngenta Seeds no Estado do Paraná, que se tornou o assentamento camponês Terra Livre. É preciso mencionar também seu enfrentamento às multinacionais de celulose que multiplicam, sobre centenas de milhares de hectares, verdadeiros “desertos verdes”, florestas de eucaliptos (monocultura) que secam todas as fontes d’água e destroem toda a biodiversidade. Esses combates são inseparáveis, para os quadros e ativistas do MST, de uma perspectiva anticapitalista radical.

As cooperativas agrícolas do MST desenvolvem, cada vez mais, uma agricultura biologicamente preocupada com a biodiversidade e com o meio ambiente em geral, constituindo assim exemplos concretos de uma forma de produção alternativa. Em julho de 2007, o MST e seus parceiros do movimento Via Campesina organizaram em Curitiba uma Jornada de Agroecologia, com a presença de centenas de delegados, engenheiros agrônomos, universitários e teólogos da libertação (Leonardo Boff, Frei Betto).

Naturalmente, essas experiências de luta não se limitam ao Brasil, sendo encontradas sob formas diferentes em muitos outros países, não apenas no Terceiro Mundo, constituindo-se numa parte significativa do arsenal combativo do altermundialismo e da nova cultura cosmopolítica da qual ele é um dos portadores.

* * *

O fracasso retumbante da Conferência das Nações Unidas sobre a Mudança Climática, de dezembro de 2009, confirma mais uma vez, para quem ainda tinha dúvidas, a incapacidade de governos à serviço dos interesses do capital em enfrentar o problema. Em vez de um acordo internacional obrigatório, com reduções substanciais de emissões de gazes com efeito estufa nos países industrializados – um mínimo de 40% seria necessário – seguida de medidas mais modestas nos países emergentes (China, Índia, Brasil), os Estados Unidos impuseram, com o apoio da Europa e a cumplicidade da China, uma “declaração” completamente vazia, que faz senão reiterar o óbvio : precisamos impedir que a temperatura do planeta suba mais de 2°C.

A única esperança é o movimento social, altermundialista e ecológico, que se expressou em Copenhagen numa grande manifestação de rua – 100 mil pessoas – com o apoio de Evo Morales, cujas declarações anticapitalistas sem ambiguidades foram uma das poucas expressões criticas na conferencia “oficial”. Os manifestantes, assim como o Fórum alternativo KlimaForum, levantaram a palavra de ordem “Mudemos o sistema, não o clima!” Evo Morales convocou um encontro de governos progressistas e movimentos sociais em Cochabamba (abril de 2010) com o objetivo de organizar a luta para salvar a Mãe-Terra, a Pacha-Mama, da destruição capitalista.

terça-feira, 1 de junho de 2010