terça-feira, 30 de setembro de 2008

O Plano do clima exclui meta para desmatamento

Dobrar a área de florestas plantadas no Brasil nos próximos sete anos e
aumentar de 0,5% para 20% a co-geração para a produção de energia são dois
dos principais objetivos do Plano Nacional de Mudança Climática, lançado
ontem. O documento destaca ainda a intenção de substituir 10 milhões de
refrigeradores até 2018 como contribuição para reduzir o impacto do
aquecimento global.

O plano é resultado de um compromisso assumido por Luiz Inácio Lula da
Silva em setembro do ano passado. Sua versão final só deverá ser assinada
pelo presidente no início de 2009, com um ano de atraso em relação à
previsão original.

Conforme a Folha adiantou na última terça-feira, o plano não estabelece
metas de redução no desmatamento, responsável por dois terços das emissões
brasileiras de gases de efeito estufa. O mais próximo que chega disso é
prever uma "redução sustentada" das taxas de desmatamento, a cada quatro
anos, até que se atinja o "desmatamento ilegal zero" -sem no entanto dar um
prazo para isso. No geral, limita-se a listar ações já existentes no país
que podem contribuir para a mitigação (redução) do CO2 e outros
gases-estufa.

O documento divulgado ontem -que será colocado em consulta pública por um
mês a partir de segunda-feira-, no entanto, avança em relação à sua versão
preliminar ao listar alguns objetivos numéricos em áreas como a dos
transportes.

"Um plano sem objetivos é um saco vazio", comentou o ministro Carlos Minc
(Meio Ambiente) ao divulgar o documento. Ele insistiu, no entanto, em que
os objetivos listados são duplamente voluntários. O Brasil, como país
subdesenvolvido, não está obrigado a cumprir metas de redução das emissões
de gases-estufa. Também não haverá punição em caso de descumprimento das
metas previstas no plano.

Dos 5,5 milhões de hectares a serem reflorestados no país até 2015, 36%
deverão receber espécies nativas. Também nesse período, a área reflorestada
deverá superar a desmatada, que chegou a 420 mil quilômetros quadrados
entre 1990 e 2005.

Segundo Suzana Kahn Ribeiro, secretária nacional de Mudança Climática, o
plano tenta organizar algumas ações já em curso e reforçar medidas já
existentes, além de compilar previsões feitas por diferentes áreas do
governo.

O principal exemplo é que os objetivos definidos para o setor de petróleo
apenas reproduzem metas de redução de emissões já definidas pela Petrobras
em seu plano estratégico, que prevê evitar o lançamento de 21,3 milhões de
toneladas de gás carbônico na atmosfera entre 2007 e 2012.

Essa ação se apequena quando comparada ao problema do desmatamento: ela
pouparia, por ano, o equivalente ao que o desmatamento emite em menos de
três dias. Todo o programa de troca de refrigeradores deixará de emitir por
ano o que o desmate emite em 9 horas.

O documento também prevê investimentos em eficiência energética, que
deverão reduzir em 10% a demanda por energia até 2030. Ao mesmo tempo, cita
o programa Luz Para Todos (de inclusão social) como medida de mitigação.

O plano destaca estímulo à produção de biocombustíveis. Com base em cálculo
da EPE (Empresa de Pesquisa Energética), o documento prevê que o país mais
do que dobrará a produção de álcool combustível em dez anos, de 25,6
bilhões para 53,2 bilhões de litros. Até 2017, a substituição de gasolina
por álcool deverá evitar o lançamento de 508 milhões de toneladas de gás
carbônico.

Críticas - Para Fabio Feldmann, secretário-executivo do Fórum Paulista de
Mudanças Climáticas, o documento é "um pouco frouxo" e deixa de fora
questões cruciais, tais como metas setoriais e redução de desmatamento. "A
iniciativa é bem-vinda, mas o que esse documento agrega ao que já está
sendo feito? Qual é a adicionalidade dele?"

Marcelo Furtado, do Greenpeace, diz que o documento é "uma decepção" ou, na
pior das hipóteses, "uma embromação". "As metas para eficiência energética,
por exemplo, são 10%, quando sabemos que hoje poderíamos obter entre 35% e
50%", diz. Outra falha do plano, segundo a ONG, é usar dados de 1994 para
calcular a contribuição do país à mudança do clima.

Objetivos do plano:

Fomentar aumento de eficiência energética
Manter a participação de energias renováveis na matriz nacional
Fomentar o aumento sustentável da participação dos biocombustíveis na
matriz de transportes, elevando em 11% ao ano a produção de álcool
Buscar a redução sustentada das taxas de desmatamento, em sua média
quadrienal, até que se atinja o desmatamento ilegal zero
Eliminar a perda líquida da área de cobertura florestal no Brasil até 2015
e dobrar a área de florestas plantadas

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Asfaltamento no coração da Amazônia pode provocar uma "tragédia nacional"

Preocupado com a iminência do que classificou de uma "tragédia nacional de grandes
proporções", o ministro Carlos Minc (Meio Ambiente) anunciou ontem a suspensão por 60
dias do processo de licenciamento ambiental de uma das obras do PAC (Programa de
Aceleração do Crescimento): o asfaltamento de trecho central da BR-319, que liga Manaus,
no Amazonas, a Porto Velho, em Rondônia.

O pedido de licença para a obra só será retomado, segundo o ministro, depois de um
estudo sobre alternativas de menor impacto ambiental, como a construção de uma ferrovia,
e o levantamento do custo de instalação, criação e manutenção de 13 unidades de
conservação federais ou estaduais na região. Esse custo terá de ser contabilizado no
preço da obra, estimado inicialmente em R$ 317 milhões, disse.

"Não somos nem seremos carimbadores de irresponsabilidades", afirmou o ministro. Segundo
ele, seria pouco prudente autorizar a pavimentação da rodovia "no coração da Amazônia"
sem responsabilizar o empreendedor da obra pelos 10 milhões de hectares de unidades de
conservação já criados ou a serem criados no entorno da BR-319.

O principal argumento usado por Carlos Minc para barrar a concessão imediata da licença
foi o aumento do desmatamento em área próxima a uma outra rodovia federal, a BR-163, no
Pará. A estrada nem foi pavimentada ainda, mas o simples anúncio de que seria asfaltada
teria aumentado em 500% o desmatamento na região.

O Ministério dos Transportes, responsável pelo empreendimento, informou que fará o que
tiver de ser feito para liberar a obra, que tem boa parte de sua extensão no Estado de
origem do ministro Alfredo Nascimento, o Amazonas. A BR-319 tem ao todo 859 quilômetros,
dos quais 459 quilômetros já foram pavimentados e passam por obras de recuperação do
asfalto.

A decisão de suspender o processo de licenciamento da rodovia do PAC foi anunciada nas
vésperas de o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) divulgar um novo aumento
no ritmo do desmatamento da Amazônia. Os números registrados pelos satélites em agosto
serão tornados públicos na segunda-feira.

No mesmo dia, Minc apresentará a lista dos cem maiores desmatadores da região. Na
relação aparecerão empresas e pessoas físicas que responderão por crime ambiental.

Segundo Carlos Minc, a proximidade das eleições municipais dificulta o combate ao
desmatamento. "Nenhum prefeito, nenhum governador, ninguém quer ser antipático",
reclamou o ministro.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Mecanismo de Desenvolvimento Limpo

Ainda falta uma definição da fiscalização dos órgãos responsáveis e do poder público, como o próprio Ministério de Meio Ambiente, em aprovar os projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). Como eles possuem uma estrutura e proposta diferente de boa parte dos projetos ambientais, há uma demora na aprovação. O Banco Central, por exemplo, lança os valores resultantes das negociações de crédito de carbono no exterior como "outros", sem especificar adequadamente. Essa falta de regulamentação e lentidão desestimula o investimento dos empresários na negociação dos créditos de carbono gerados, principalmente, através da implantação do MDL.

Em meados de junho de 2008, existia um total de 3.471 projetos em alguma fase do ciclo de MDL, sendo que 1.071 já estão registrados pelo Conselho Executivo do Mecanismo e 2.400 em outras fases. No que diz respeito à redução das medidas projetadas, o país está na mesma posição, reduzindo 294.432.537 de toneladas de dióxido de carbono (CO2), o correspondente a 6% do total mundial. Os setores com o maior número de aprovações são o de energia sustentável, suinocultura e aterro sanitário, respectivamente, entre outros.

Apenas 8%, que equivale a 287 trabalhos de MDL, estão em atividade atualmente no país. Então, o que é preciso para que os 92% restantes sejam concretizados também? Se a participação de projetos brasileiros é tão intensa como dizem, inclusive no que se refere à criação de novas leis contra crimes ambientais, por que ainda falta incentivo adequado para a prática do MDL? Em parte, isso se deve à preocupação com o risco de deságio, mas também não significa que a venda do crédito de carbono não seja capaz de viabilizar todo um projeto.

Quando o Protocolo de Kyoto teve início, em 1997, e estabeleceu a redução de emissão de CO2, bem como de outros gases responsáveis pelo efeito estufa, a ONU (Organização das Nações Unidas) criou o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). O objetivo desta medida é que os países desenvolvidos invistam em projetos de energia limpa nas nações em desenvolvimento, deixando de liberar material poluidor na atmosfera. Desde então, os projetos de MDL lutam para sair do papel, já que muitas das medidas de regulamentação, criadas para ajudar o processo, são tão lentas e burocráticas que acabam por atrapalhar a sua concretização.

Apesar de o Brasil estar atrás apenas da China e da Índia em projetos de mecanismo de desenvolvimento limpo, grande parte das empresas que desenvolvem projetos de MDL não sabem como contabilizar os créditos negociados. Desconhecem a classificação das operações cambiais - já que os valores são todos negociados no exterior -, e como não existe ainda uma regulamentação tributária específica, arcam com os impostos mais elevados, o que não tem fundamento. Além de os créditos de carbono não representarem a atividade-fim de nenhuma empresa, ainda são de extrema importância para a redução de emissões de gases que causam o aquecimento global.

Infelizmente para nós, brasileiros, a falta de regulamentação e normas claras para o investimento nestes projetos e para a negociação dos créditos ainda impede que o país se destaque neste mercado. Além de estas medidas serem de grande importância para o planeta, com a transformação do CO2 em créditos de carbono e a não liberação de gases de efeito estufa, também deixam de trazer capital para os países em desenvolvimento. O resultado é o aumento desenfreado do aquecimento global, que deve ser encarado com a seriedade necessária, como um problema universal e que precisa de alto investimentos para ser solucionado.

* Mauricio Roberto Maruca é administrador de empresas, formado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP é pós-graduado em Gestão de Projetos Ambientais. Também é especialista em administração de projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) e Protocolo de Quioto, com ênfase em captação de biogás de aterros sanitários. No segmento ambiental desde 2002, Maruca é sócio fundador da Araúna Energia e Gestão Ambiental e um dos pioneiros no Brasil a realizar negociações de créditos de carbono com diversas empresas, tendo se especializado em contratos desse segmento.

* Por Maurício Maruca - 25/09/2008 - 01h09 (Envolverde/Portal do Meio Ambiente)

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

LISTA OFICIAL TRAZ 472 ESPÉCIES DA FLORA BRASILEIRA DE EXTINÇÃO

A nova Lista Oficial das Espécies da Flora Brasileira Ameaçadas de Extinção elaborada pela Fundação Biodiversitas sob encomenda do MMA relaciona 472 espécies, quatro vezes mais que a lista anterior de 1992. Os biomas com maior número de espécies ameaçadas são Mata Atlântica (276), Cerrado (131) e Caatinga (46). Amazônia aparece com 24 espécies, o Pampa com 17 e Pantanal com duas. Nenhuma espécie da lista anterior foi excluída. A instrução normativa (IN) atualizando a lista foi assinada, na sexta-feira (19), pelo ministro Carlos Minc. Segundo Minc, o desafio agora é coibir o crime ambiental, criar mais unidades de conservação, estimular a criação de RPPNs e tomar medidas para impedir o corte, o transporte e a comercialização de espécies ameaçadas. "Essa lista coloca para nós uma série de desafios para revertermos o quadro da destruição da biodiversidade e todos temos um papel importante a desempenhar", disse. De acordo com a instrução normativa, que deve ser publicada no DOU desta semana, as espécies constantes da lista são consideradas prioritárias para efeito de concessão de apoio financeiro à conservação pelo governo federal e sua coleta será efetuada somente com autorização do órgão ambiental competente. Também constam da lista das ameaçadas, 12 espécies de importância madeireira que já integram a lista de 1992. A nova lista adiciona uma única espécie de interesse madeireiro, o "pau-oxo" (Peltogyne maranhensis), da Amazônia. Entre as outras espécies de uso econômico estão algumas de uso alimentício (palmito/juçara), medicinal (jaborandi), cosmético (pau-rosa) e também ornamental. No que se refere às regiões brasileiras, o Sudeste apresenta o maior número de espécies ameaçadas (348), seguido do Nordeste (168), do Sul (84), do Nort (46) e do Centro-Oeste (44). Neste contexto, Minas Gerais (126), Rio de Janeiro (107), Bahia (93), Espírito Santo (63) e São Paulo (52) são os estados com maior número de espécies ameaçadas. Fonte: InforMMA.



Milena Ventrichi Martins & Juliana Letícia De Fazio
Representantes Discentes
Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas -
Botânica
Unesp - Botucatu - SP

Mudanças de Clima: quem tem medo de metas no Brasil?

Rubens Born e Juliana Russar

Está prometida para esse mês a divulgação do rascunho do Plano Nacional sobre Mudança do Clima pelo governo brasileiro. Essa versão ficará disponível para consulta pública durante trinta dias e, em novembro, o Plano será lançado com a presença do presidente Lula, em evento que antecede a 14ª Conferência das Partes (CoP) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), em Poznan, Polônia.

Como signatário da UNFCCC, o Brasil está em débito há pelo menos 14 anos com esse tratado internacional, desde quando o Congresso Nacional ratificou a Convenção, ganhando, assim, status de lei no país. Essa lei, em seu artigo 4.1 (b), obriga o país a elaborar um plano e uma política nacional "que incluam medidas para mitigar a mudança do clima, enfrentando as emissões antrópicas por fontes e remoções por sumidouros de todos os gases de efeito estufa não controlados pelo Protocolo de Montreal, bem como medidas para facilitar a adaptação adequada à mudança do clima". Nesse sentido, somente em novembro de 2007, mais uma vez às vésperas de uma CoP, o decreto nº 6.263 instituiu o Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CIM) para elaborar o Plano Nacional sobre Mudança do Clima, cuja versão preliminar deveria estar pronta até 30 de abril de 2008.

Mesmo não possuindo compromissos quantificados de limitação e redução de emissões (metas obrigatórias), o Brasil, assim como todos países da UNFCCC, tem obrigações internacionais, legais e morais para cumprir seus compromissos no âmbito da Convenção. Na CoP-13, em 2007, aceitou que para a melhor implementação da Convenção os países em desenvolvimento devem adotar ações nacionais de mitigação que sejam mensuráveis, reportáveis e verificáveis para o pós-2012, quando termina o primeiro período de compromissos do Protocolo de Kyoto. Assim, o Brasil deve começar a considerar que tipos de ações serão colocadas em prática para desacelerar o crescimento, estabilizar e reduzir suas emissões de gases efeito estufa nos diversos setores, ainda mais porque, apesar da grande maioria das emissões de gases de efeito estufa do país serem provenientes do desmatamento (75%), há a tendência de crescimento relativo das emissões associadas ao uso de combustíveis fósseis.

No entanto, pronunciamentos oficiais, notadamente originários dos Ministérios das Relações Exteriores (MRE) e de Ciência e Tecnologia (MCT), rejeitavam compromissos na forma de metas para países em desenvolvimento, interpretando isso como cortes obrigatórios de emissões, que até agora são exigidos somente de países desenvolvidos. Nem todos os compromissos são metas, e nem metas podem se restringir à limitação e redução de emissões quantificadas em nova fase do regime multilateral. Por exemplo, poderia haver metas ou parâmetros de emissões por unidade de produto em determinados setores da economia. Metas ou objetivos mensuráveis significariam para países como o Brasil, em uma primeira etapa, compromissos para estabilizar emissões ou pelo menos reduzir a taxa de crescimento de emissões de gases de efeito estufa ou a taxa de perda de sumidouros e reservatórios de carbono (ou seja, de desmatamentos).

Esperamos que o Brasil adote pelo menos metas internas de estabilização e de redução de emissões, já que, sendo um dos maiores emissores do planeta, não pode deixar de dar ouvidos aos argumentos científicos (necessidade de pico e declínio brusco das emissões na próxima década para impedir mudança climática perigosa); políticos (é signatário da Convenção, possui obrigações); éticos (é um dos maiores emissores, essa geração deve combater o problema); e de desenvolvimento sustentável (reduzir significa expansão de atividades econômicas ambientalmente sustentáveis). Além disso, é plausível supor que em uma ou duas décadas, no máximo, o Brasil terá que se comprometer internacionalmente, para o bem de sua população e para cumprir com sua responsabilidade global, com limites de emissões de gases de efeito estufa. Em pouco tempo, os órgãos governamentais em todas as esferas, empresas, entidades da sociedade civil deverão estar preparados do ponto de vista institucional, tecnológico, econômico e cultural para fazer frente a esse desafio da sustentabilidade ambiental. Então, por que não ampliar o debate e iniciar, de alguma forma (voluntária, por meio planos e políticas locais e nacional), a adoção de medidas e programas, privados e públicos, que contribuam para a mitigação das emissões brasileiras?

O Brasil possui metas para várias áreas, como, por exemplo, meta de inflação, meta de crescimento, meta de superávit primário, meta para saneamento básico, etc. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) guia-se por metas. Metas e objetivos mensuráveis são instrumentos de controle social, de transparência, que auxiliam a governabilidade e o rumo das políticas e das atividades sócio-econômicas. Enfim, muitos se perguntam: Por que o país não pode ter metas relacionadas a emissões de gases de efeito estufa? Quem tem medo desse tipo de meta? Que setores da sociedade resistem à adoção de compromissos para limitar as emissões de gases de efeito estufa no Brasil e por quê? Teria o governo federal estrutura capaz de envolver estados e municípios nesse desafio, assegurando uma divisão justa, eqüitativa e efetiva das responsabilidades, limitações e reduções das emissões? Estariam a Casa Civil, o Ministério da Agricultura, o Ministério de Minas e Energia e demais ministérios dispostos a assumir compromisso com um plano que prevê medidas sérias de mitigação e adaptação às mudanças climáticas a curto, médio e longo prazo? Por que setores privados, como os do agronegócio, de indústria e de energia manifestaram-se, nas consultas públicas para o plano nacional de mudança de clima, contra a adoção de compromissos nacionais de mitigação de gases de efeito estufa?

Um Plano Nacional sobre Mudança do Clima sério e responsável deve ter parâmetros (ou metas ou objetivos mensuráveis ou compromissos) para poder ser qualificado como "plano", e não ser meramente uma declaração de intenções.

Publicado no Jornal Valor Econômico



Rubens Born e Juliana Russar são membros do Vitae Civilis - Instituto para o Desenvolvimento, Meio Ambiente e Paz, ONG envolvida desde 1990 com as negociações internacionais em mudança de clima

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Água mineral feita a partir do mar paulista chega aos EUA.

Moradores de Miami, na Flórida (EUA), poderão a partir do próximo mês
entrar em lojas de conveniência da cidade e levar pra casa uma nova garrafa
de água mineral, a H2Ocean. Seria apenas mais uma marca no mercado, não
fosse por um detalhe: a H2Ocean é feita a partir da água do mar, com
aplicação da nanotecnologia. E mais. O processo foi desenvolvido por
brasileiros. A H2Ocean nasceu da experiência de dois cientistas, que
começaram a desenvolver a tecnologia de controle de minerais em água
dessalinizada. Isso ocorreu há dez anos. Em seguida, somaram-se à dupla
outros dois sócios. Em 2003, eles conseguiram a patente do processo e
passaram a bater de porta em porta para tentar comercializar a água. 'Ao
longo de dez anos, foram investidos cerca de US$ 2 milhões na companhia',
diz Rolando Viviani, gerente de marketing da H2Ocean. Segundo ele, todas as
pesquisas foram feitas com recursos próprios dos quatro sócios. Seus nomes,
por enquanto, são mantidos em sigilo. No início, o objetivo da H2Ocean era
vender a água 'nanotecnológica' no Brasil. A empresa alega ter procurado a
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em 2006 para realizar o
pedido de registro do engarrafamento do produto. A resposta teria sido a de
que não há legislação específica para que esse tipo de água seja vendido no
país por conta da sua fonte: o mar. Procurada, a Anvisa informou que a
H2Ocean nunca entrou com um pedido de registro. A empresa, entretanto,
enviou ao Valor fac-símile da página da Anvisa na internet em que aparece o
número do processo do registro e do protocolo, em nome de Aquamare
Beneficiadora e Distribuidora de Água. A data de entrada é de outubro de
2006 e o pedido foi negado em março do ano passado. Em dezembro, a mesma
Aquamare fez uma segunda tentativa, enviando uma carta à Anvisa em que
pedia esclarecimentos sobre o que fazer para obter o registro. A resposta
veio quatro meses depois, com a indicação de que a empresa deveria
'importar' uma legislação sobre o assunto. Ao Valor, a Anvisa também
informou que 'a empresa interessada na produção (...) de água dessalinizada
deve apresentar, preferencialmente por intermédio de uma associação,
proposta de regulamentação para avaliação pela Anvisa'. As dificuldades
para se obter o registro no Brasil levaram a H2Ocean a mudar de estratégia.
A empresa continua interessada em obter a aprovação da Anvisa, mas decidiu
priorizar a busca por novos mercados. A opção foi pelos EUA. 'O registro da
empresa saiu em três horas e a água foi analisada em 15 dias. Nos EUA,
conseguimos resolver em três meses tudo o que não conseguimos aqui em
quatro anos', afirma Viviani. O Valor, porém, não teve acesso ao registro
obtido no exterior. A venda da H2Ocean começa nos Estados Unidos em agosto,
em três estados: além da Flórida, Nova Jérsei e Atlanta. Foram embarcados
oito contêineres do produto, feito inicialmente na fábrica de Bertioga,
litoral sul de São Paulo. A unidade poderá ser desativada em breve. A
produção deve ser transferida para os EUA no fim deste ano. A
nanotecnologia foi o instrumento utilizado pela H2Ocean para transformar a
água do mar em água mineral dessalinizada. A água dos oceanos é rica em
micro e macro nutrientes, como o boro, o cromo e o germânio - elementos dos
quais o corpo humano necessita, em pequenas doses. Com a nanotecnologia, a
H2Ocean conseguiu, a partir da água recolhida em alto mar, retirar o sal e
manter grande parte dos minerais. Para chegar a esse resultado, os
cientistas criaram um filtro com nanotecnologia aplicada, o nanofiltro. O
processo inicial é o mesmo que se faz desde a década de 1940: a
dessalinização. Depois de retirado o sal, restam duas opções, segundo
Viviani: 'Ou todos os minerais são retirados da água ou ela continua
salgada'. Com uma sequência de nanofiltragens, a H2Ocean conseguiu manter
63 dos 86 minerais contidos na composição inicial. Surgiu a água do mar
mineral. Para saber se o resultado é bom, o brasileiro vai ter de esperar.
Ou passar em alguma 'deli' na próxima viagem à Disney.

(Fonte: Gazeta Mercantil - 30.07.08
)

Seul limpa rio poluído em tempo recorde


Seul limpa rio poluído em tempo recorde

Cheonggyecheon e Tietê são muito parecidos, quase primos. Dois rios que
cortam duas grandes metrópoles, Seul e São Paulo; dois rios extremamente
poluídos, símbolos da degradação das cidades e do desenvolvimento a
qualquer custo. Ambos receberam milhões de dólares para serem
revitalizados. Aí começa a diferença: além dos milhares de quilômetros

que separam Cheonggyecheon e Tietê, um deles foi totalmente revitalizado
em apenas quatro anos e hoje tem cascatas, fontes, peixes, crianças
brincando e jovens se divertindo. Já o outro está há 16 anos esperando
sua limpeza, sem vislumbrar quando de fato isso irá acontecer.

O governo de Seul iniciou o que se pode chamar de renascimento do
Cheonggyecheon, no coração da capital sul-coreana, em julho de 2003. Por
sobre o fétido canal havia um enorme viaduto, quase um Minhocão, que foi
implodido. A revitalização integrou projeto de nova política de
transportes públicos para uma cidade sustentável.

Gyengchul Kim, diretor do Instituto de Desenvolvimento de Seul, contou
que os governantes adotaram, a partir de 2002, medidas em favor da
utilização de ônibus e metrô. O caso mais emblemático foi a derrubada
do
viaduto sobre o leito do Cheonggyecheon. Em lugar da obra, construída em
1960, foi iniciada sua revitalização, com um parque linear para
recreação e atrações culturais.

O curso d'água recebeu peixes e vegetação. Foram erguidas fontes
luminosas que se tornaram pontos de visitação. A temperatura em Seul, em
virtude das melhorias no meio ambiente proporcionadas pelo novo
Cheonggyecheon, diminuiu 3,6°C, indo de 36,3°C para 32,7°C. Tudo ao
custo de US$ 370 milhões na época (hoje algo em torno de R$ 700
milhões).

Vencido o desafio, a restauração dos 5,8 quilômetros do rio teve impacto

econômico positivo para a cidade. Segundo representantes da Organização
para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), sediada em Paris,
foi criada uma outra imagem da Coréia do Sul, contribuindo para a
promoção do país no mercado internacional e para a atração do capital
estrangeiro. "Seul deve descartar os excessos do desenvolvimento e se
tornar ecologicamente correta, para prosperar. Pense diferente,
eco-eficientemente. Não para mais carros, mas sim pelas pessoas", disse
Kim.

O rio sul-coreano era responsável pela drenagem das águas de toda a
cidade, com mais de 10 milhões de habitantes. No auge do
desenvolvimento, o leito se tornou poluído. A calha principal acabou
parcialmente aterrada e agora reaberta. Hoje, as águas que correm por lá
são bombeadas do Rio Han.

Aqui, o programa de despoluição do Tietê já custou US$ 1,5 bilhão, ou
quase R$ 3 bilhões aos cofres do Estado, desde sua implementação em
1992. Tantos gastos e esforços, e a sensação que se tem é que a
poluição
continua cada vez maior.

O Tietê, quando atravessa os municípios da Grande São Paulo, recebe uma
infinidade de esgotos, efluentes industriais e lixo. O engenheiro Julio
Cerqueira Cesar Neto, da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e

Ambiental, estima que sejam despejados nos rios e córregos da capital
cerca de 39 mil litros de esgoto in natura por segundo, que de certa
forma acabam no Tietê.


Arminda Jardim
ISA - Instituto Socioambiental
Programa Mananciais
arminda@socioambiental.org
Tel 11 3515 8971
Fax 11 3515 8904


Voce sabe de onde vem a agua que voce bebe?
Participe da Campanha De Olho nos Mananciais: http://www.mananciais.org.br

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Minc propõe antecipar redução de enxofre no diesel

O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, disse que propôs nesta quarta-feira (10), na
reunião do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), a antecipação de 2017 para 2012
da regra que obrigará os novos veículos a diesel a emitirem apenas 10 partículas de
enxofre por milhão. A partir de janeiro do ano que vem já entra em vigor a resolução
315, de 2002, do Conama, segundo a qual nenhum veículo a diesel sairá de fábrica sem
reduzir a emissão de enxofre para 50 partículas por milhão.

Atualmente, segundo Minc, os veículos que circulam nas cidades emitem 500 partículas por
milhão de enxofre e os que rodam no interior liberam 2 mil partículas. "O diesel que nós
respiramos é de péssima qualidade", disse o ministro, ressaltando que o governo não vai
prorrogar o prazo para a vigência da resolução. "Nós não aceitamos a prorrogação. As
empresas (Petrobras e montadoras) tiveram seis anos para resolver isso. Os veículos só
sairão da fábrica cumprindo a resolução", afirmou.

O gerente de soluções comerciais da área de abastecimento da Petrobras, Frederico
Kremer, que acompanha a reunião do Conama, disse que a empresa "vê com bons olhos" a
proposta apresentada por Minc ao conselho, de antecipar a meta de redução de enxofre.
Questionado se a empresa terá como fornecer o diesel com apenas 50 partículas de enxofre
por milhão a partir de 2009, Kremer disse que se os veículos que deverão atender essa
exigência estiverem no mercado, a Petrobras vai fornecer o combustível.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Satélite localiza 40 lagos não cadastrados no Amazonas

Este ano, a identificação e a localização geográfica de 40 lagos ainda não reconhecidos
é um dos resultados do processo e análise das imagens Ikonos 2, realizada pelo Instituto
de Geociências da Universidade de Brasília (UnB) e do Instituto de Geociências da
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Esse resultado evidencia a importância do Sistema de Informação Geográfica (SIG) para a
gestão das reservas de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (RDSM/MCT) e Amaná (RDSA),
no Amazonas, por meio da atualização das bases cartográficas, que dão apoio às
atividades desenvolvidas naquelas duas unidades de conservação.

Os lagos identificados, ainda não cadastrados em nenhuma base de dados, foram
localizados nos setores Jarauá, Tijuaca e Coraci, os dois primeiros localizados na
Reserva Mamirauá e o último, na Reserva Amaná. A partir dessa informação, é possível
incrementar as ações de manejo naquelas áreas, colaborando, assim, com a
sustentabilidade ecológica, sempre com a participação dos moradores.

O objetivo do SIG é criar sistemas de informação geográfica sobre a pesca, o
desmatamento e o uso do solo nas margens dos corpos d’água da RDSM e da RDSA, com o uso
de imagens de alta definição.

Dessa forma, o sistema é uma ferramenta útil para organizar informações e planejar
ações. O SIG do IDSM atende a solicitações dos pesquisadores do Instituto, além de
acompanhar os monitoramentos e pesquisas desenvolvidas nas Reservas, entre elas o
mapeamento de áreas de uso florestal e monitoramento de fauna.

Maria Carolina Ramos - Assessoria de Imprensa do Instituto Mamirauá

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

Defensivo agrícola é veneno mesmo

"Existem coisas que você não gostaria de ter na sua mesa, agrotóxicos, por
exemplo", era a frase escrita num cartaz da Semana dos Orgânicos de alguns
anos atrás. Agora todos nós temos mais razões ainda para não querê-los. A
Folha de sábado 23/08/2008 noticiou: Brasil importa agrotóxico vetado no
exterior. Lá podemos ler que, enquanto a justiça proíbe a Anvisa (Agência
Nacional de Vigilância Sanitária) de fazer a reavaliação toxicológica de
agrotóxicos comercializados no país, o Brasil já importou, até 31 de julho
de 2008, 34.255 toneladas de substâncias que foram vetadas pelos próprios
países que as produzem. São produtos usados em grande quantidade em
alimentos como batata, tomate, banana, feijão, arroz, abacate, abacaxi,
beterraba, citrus, couve, maçã, pêra, pêssego, uva, trigo, café etc. Como
podemos ver, alimentos de consumo diário regados com agrotóxicos proibidos
em países lá fora.


Na imprensa e na mídia em geral, pouco se noticia sobre o uso de veneno nos
alimentos. Assim o consumidor nem sabe o que acontece na agricultura e
pensa que está tudo perfeitamente bem com os alimentos que consome. Por
isso até é bom que algo mais grave aconteça que faz com que este assunto
chegue até o noticiário. Dessa maneira ficamos sabendo também dos lobbys
poderosos dos fabricantes de agrotóxicos e sua falta de escrúpulos.


Um dos produtos proibidos no exterior é o herbicida Paraquate, também
chamado Gramaxone. A importação, em comparação a 2006, aumentou 311 vezes:
de 82 toneladas para 25.839 toneladas, até 31 de julho de 2008. O produto é
muito perigoso, principalmente para os trabalhadores rurais que aplicam o
produto. Um grama ingerido por uma pessoa de 60 kg já é fatal. A morte
surge após alterações gastrointestinais, insuficiência respiratória aguda
que evolui para fibrose pulmonar, insuficiência renal por necrose tubular e
insuficiência renal e hepática. Quando a dose ingerida é mais de um grama,
é letal em horas ou poucos dias, principalmente por destruição do pulmão.
Infelizmente não existe antídoto específico para este veneno.


Os outros 4 produtos são: paration metílico, endossulfan, carbofuran e
metamidofós. São produtos que matam por contato, através do estômago ou
pulmão, e alguns são sistêmicos, quer dizer, penetram na pele do homem,
animal e planta. Na planta ficam circulando na seiva, o que impossibilita a
remoção através de lavagem. A toxicidade (LD50) varia de 8 - 40mg por kg de
peso. Isso quer dizer: a quantidade de miligramas (mg) do veneno que
precisa para matar 50% dos ratos em teste de laboratório (Letal Dose LD
50). Para uma pessoa de 60 kg (60kg x 8mg = 480 mg): igual a 0,5 grama,
para matar um homem. Dá para entender o absurdo de jogar isso no nosso
alimento, inclusive nos alimentos para crianças e da merenda escolar?


Defensivo agrícola é veneno mesmo. Ainda bem que, para os consumidores
conscientes, existem os alimentos orgânicos certificados.


Joop Stoltenborg

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Sonho da ''revolução'' do biodiesel de mamona chega ao fim no Piauí e promove desmatamento.

Com a frustração da experiência, agricultores abandonam as
terras e sobrevivem da doação de cestas básicas

Ribamar Oliveira e Wilson Pedrosa escrevem para “O Estado
de São Paulo”:

Depois de três anos, o sonho do presidente Lula de produzir
biodiesel de mamona parece ter chegado ao fim. Ao colherem
este ano uma safra irrisória, os pequenos agricultores do
projeto Santa Clara, localizado entre as cidades de Canto
do Buriti e Eliseu Martins, no sul do Piauí, sobrevivem de
favores, de cestas básicas, e estão convencidos de que
plantar mamona não é um bom negócio.

A própria empresa Brasil Ecodiesel, encarregada do
empreendimento, já procura alternativas à mamona e passou a
fazer experimentos na região com outras plantas, como o
girassol e o pinhão manso. Mas as iniciativas são
preliminares, pois ainda faltam conhecimentos técnicos mais
profundos sobre as culturas alternativas.

Como resultado do fracasso do empreendimento, a usina de
produção de biodiesel mantida pela empresa em Floriano, a
260 quilômetros de Teresina, capital do Piauí, está em
ritmo lento e vem utilizando basicamente a soja como
matéria-prima, na ausência da mamona. No projeto Santa
Clara, a imagem é de abandono, com muitas famílias deixando
a área e as casas, construídas no início do projeto,
desocupadas e destelhadas.

Primeira colheita - No dia 4 de agosto de 2005, Lula
participou da primeira colheita de mamona no projeto Santa
Clara, que serviria de modelo para a integração da
agricultura familiar ao programa do biodiesel. Na época, o
entusiasmo do presidente era grande. Ele chegou a dizer aos
pequenos agricultores presentes na solenidade que era
possível fazer "uma revolução" a partir da mamona. A
realidade, porém, mostrou-se bastante diferente do sonho
vendido pelo presidente.

"Não colhi mamona nenhuma este ano", disse o agricultor
Pedro José de Souza Filho, que guarda uma foto de Lula,
quando o presidente visitou a sua modesta casa, durante a
solenidade da colheita de 2005. "Só colhi mesmo dois sacos
de feijão." E Pedro não foi o único que não colheu nada ou
quase nada.

No início do ano, uma praga de lagartas dizimou os
primeiros plantios de mamona do assentamento. A empresa
Brasil Ecodiesel, parceira dos agricultores no
empreendimento, foi obrigada a fazer o replantio. Mas não
houve tempo. Em algumas áreas, a empresa chegou a arar a
terra, mas a maior parte ficou sem plantio, o que afetou o
rendimento dos agricultores.

O montante da safra deste ano ainda não é conhecido, mas as
evidências indicam enorme frustração. "A safra de 2008 foi
um desastre", disse Lino Hipólito Neto, um dos líderes dos
agricultores. Ele próprio não colheu sequer uma saca de
mamona. A empresa Brasil Ecodiesel informou ao Estado que
"os volumes são relativamente baixos frente ao tamanho do
projeto de agricultura familiar que a empresa desenvolve no
Brasil, com cerca de 30 mil famílias". Os agricultores, que
são chamados de "parceiros", dizem que a produção vem
caindo ano após ano.

Em 2005, o primeiro ano do empreendimento, a colheita foi
excepcional. Um levantamento feito pelos próprios
agricultores indica que a safra do ano em que Lula visitou
o empreendimento foi de 1,8 mil toneladas. No ano seguinte,
a produção caiu para 1,2 mil toneladas. Em 2007, ano de
pouca chuva, a produção caiu para somente 643 toneladas.
Este ano, acredita-se que a colheita não tenha chegado à
metade daquela obtida no ano passado.

A expectativa da empresa Brasil Ecodiesel era que cada
parceiro conseguisse uma produtividade de pelo menos uma
tonelada de mamona por hectare. "Em 2005, alguns parceiros
chegaram a colher 2 toneladas por hectare", lembrou Lino
Neto. Mas a produtividade foi caindo a cada ano, por causa
de uma série de fatores, incluindo a falta de correção do
solo e a piora na qualidade das sementes utilizadas,
segundo informaram os agricultores.

Células - O projeto Santa Clara impressiona por suas
dimensões. No início, eram 665 famílias distribuídas em 19
assentamentos, chamados de "células". Cada uma das famílias
ganhou um lote de 8,5 hectares. Deste total, 5 hectares
deveriam ser destinados ao plantio da mamona e 2,5 hectares
ao plantio do feijão.

A empresa ficaria com 30% da produção de cada "parceiro"
para cobrir os seus custos com o empreendimento e os
adiantamentos de dinheiro feitos aos agricultores. Não
seria permitido o cultivo de qualquer outro produto na
área. Apenas um hectare ficaria para que o "parceiro"
pudesse cultivar o que desejasse. Mas essa regra não foi
seguida por todos. Como o cultivo da mamona não apresentou
os resultados esperados, alguns agricultores passaram a
plantar mandioca e milho para aumentar sua renda. A empresa
terminou aceitando a solução.

Porém, mesmo com essa flexibilização, a sobrevivência dos
"parceiros" está dependendo da boa vontade da Brasil
Ecodiesel, que paga R$ 164 por mês para cada família e
ainda distribui uma cesta básica. Mas isso é um favor
prestado pela empresa, pois não está no contrato, e os
agricultores não sabem como irão um dia pagar esses
benefícios. Por causa das dificuldades, os agricultores
estimam que cerca de 40 famílias já deixaram o
empreendimento.

Usina de biodiesel substitui mamona por óleo de soja - Não
há movimento de caminhões no pátio da usina de biodiesel da
Brasil Ecodiesel, em Floriano. As evidências são de que a
fábrica funciona em ritmo lento e a produção é mínima. Há
denúncias na cidade de que a empresa começou a demitir
parte dos funcionários. Essa usina de biodiesel foi montada
para processar a mamona produzida no projeto Santa Clara.

O problema é que não há mamona suficiente para fazer a
fábrica produzir - além disso, segundo a Agência Nacional
do Petróleo (ANP), o biodiesel produzido apenas com mamona
é muito viscoso e danifica os motores.

A empresa Brasil Ecodiesel admite que está produzindo
biodiesel com óleo de soja. "O óleo de soja ainda
representa mais de 90% dos óleos utilizados para a produção
de biodiesel da Brasil Ecodiesel em suas unidades
industriais", diz comunicado da empresa enviado ao Estado.
O comunicado é ambíguo, pois não especifica qual é a
matéria-prima usada na produção do biodiesel na usina de
Floriano.

"A companhia pretende reduzir o percentual de utilização do
óleo de soja na medida em que sua estratégia de
“originação” (sic) agrícola seja expandida, elevando o
percentual de utilização dos óleos de mamona, girassol e,
no longo prazo, pinhão manso", diz o comunicado.

Há um motivo para a fabricação do biodiesel da mamona por
agricultores familiares. A produção de combustível de
mamona ou de outras oleaginosas, no regime da agricultura
familiar, concede ao empreendedor o "selo combustível
social", que dá direito a incentivos fiscais: isenção da
contribuições para Financiamento da Seguridade Social
(Cofins) e para o Programa de Integração Social (PIS).
Também dá direito a financiamentos do BNDES, BnB e do Basa
(Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social,
Banco do Nordeste, Banco da Amazônia) a juros mais baixos.

O secretário de governo da prefeitura de Floriano,
Edilberto Batista de Araújo, não tem dúvidas de que o
futuro da usina da Brasil Ecodiesel é a soja. Segundo ele,
o cultivo está em expansão no sul do Piauí. "Temos cerca de
2 milhões de hectares de cerrado, área propícia à produção
de soja. Esta é uma das últimas fronteiras agrícolas do
País."

Carvoaria e desmatamento - A carvoaria do projeto Santa
Clara não é fácil de ser encontrada. É preciso andar muito,
em meio à vegetação nativa, por estradas de areia que
cortam o empreendimento. Mas, ao final da busca, é possível
observar um grande edifício industrial. "É o maior e mais
moderno forno de carvão do Piauí", diz o ambientalista
Judson Barros, presidente da Fundação Águas do Piauí
(Funáguas). "Esse forno é controlado por computador".

É difícil imaginar que um projeto voltado à integração
social e ao respeito à ecologia precise queimar a madeira
nativa da região, de solo pobre, para sobreviver. O mais
impressionante é que a empresa responsável pelo
empreendimento, a Brasil Ecodiesel, promove, anualmente, a
Semana do Meio Ambiente do Projeto Santa Clara, da qual
participam os agricultores do empreendimento e seus filhos.

Há um grande desmatamento na região do projeto. As árvores
foram cortadas e, depois, a madeira foi abandonada, em
montes, na região. A empresa Brasil Ecodiesel admitiu a
existência da carvoaria. "A produção de carvão foi a
solução encontrada para a estruturação do Núcleo Santa
Clara, quando foi preciso abrir espaço das áreas, visando
ao plantio de mamona, matéria-prima para a produção de
biodiesel", informou, em comunicado dirigido ao Estado.

A empresa assegura que possui a licença ambiental do Ibama
para cortar a madeira e produzir o carvão. Mas recusou-se a
informar o número da licença ambiental concedida pelo
instituto. Em vez de comprovar a licença do Ibama, a Brasil
Ecodiesel preferiu dizer que a atividade da carvoaria está
paralisada desde 2006.

A empresa tentou justificar a grande quantidade de madeira
encontrada no pátio da carvoaria. "As madeiras encontradas
atualmente na carvoaria do Núcleo Santa Clara são resíduos
florestais resultantes da abertura de espaço realizado no
início da implantação do projeto."

A prefeita de Eliseu Martins, Terezinha Dantas (PSDB), não
esconde a sua preocupação com os destinos do projeto Santa
Clara. A cidade de Eliseu Martins está localizada a 20
quilômetros do empreendimento. "Eles desmataram muito",
disse a prefeita. "Dá pena de ver", lamentou.