quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

Relatório sobre a Conferência de Bali

1 - A Conferência da ONU sobre Mudança do Clima
realizada em Bali nos primeiros dias de dezembro, teve um resultado
acima da expectativa, dado o pessimismo com que foi instalada.


2 - Entretanto, este resultado ficou abaixo do julgado
necessário, com base nas previsões do IPCC relativas às emissões de
gases que agravam o efeito estufa, ao aumento da temperatura global da
Terra e às mudanças climáticas, com risco para o futuro da humanidade.


3 - Terminou acima da expectativa porque os EUA na última
hora concordaram, sob grande pressão, a assumir o compromisso de
reduzir suas emissões, juntando-se aos demais países desenvolvidos,
após 2012. Neste ano terminará o prazo dado pelo Protocolo de Kioto
para os países ricos e ex-comunistas reduzirem suas emissões, como um
todo, abaixo do valor que tinham em 1990. Estes países foram
enquadrados no Anexo I da Convenção do Clima da ONU por terem alto
consumo de energia per capita, em especial de combustíveis fósseis
cuja queima produz o CO2.


4 - Bali superou o pessimismo também porque os países em
desenvolvimento, especialmente China, Índia, Brasil e África do Sul,
concordaram em tomar medidas para conter o aumento das emissões de
maneira voluntária, porém ?quantificáveis e verificáveis?. Assim,
entraram todos no mesmo barco para chegar em 2012.


5 - Mas, ao contrário do desejo de alguns, manteve-se o
princípio formulado na Conferência do Rio, em 1992, da
?responsabilidade comum, porém diferenciada? entre países do Anexo I e
os países em desenvolvimento, que têm baixo consumo de energia per
capita. Assim, enquanto os primeiros se obrigam a reduzir emissões, os
últimos deverão conter o aumento delas por metas voluntárias, mas
verificáveis. De certo modo resgata a antiga proposta de contração e
convergência para diminuir a distância entre o consumo de energia dos
países ricos e o dos países em desenvolvimento.


6 - Essas deliberações se consubstanciaram no chamado ?Road
Map?, que mapeará o caminho para se chegar aos novos compromissos para
o período que começará em 2012. Essa expressão foi cunhada com forte
participação dos negociadores brasileiros em uma reunião prévia à de
Bali. Foi convidado XXXXX Figueiredo, do Itamarati, para presidir a
Comissão criada em Bali pela ONU para dar curso às decisões da
Conferência.


Isso reflete a importância do Brasil, ao lado da China, nas negociações


7 - Além dos negociadores oficiais do Itamarati e dos
Ministérios do Meio Ambiente e de Ciência e Tecnologia, houve uma
intensa atividade de membros da sociedade civil brasileira presente em
Bali, participando de diferentes seminários e reuniões paralelas às
negociações.


8 - O Fórum Brasileiro de Mudança Climática apresentou a
proposta de um Plano de Ação para o Brasil, colocando a necessidade de
metas para redução do desmatamento, no seminário que o governo do
Estado do Rio de Janeiro, através da Secretaria do Ambiente /
Superintendência de Mudança Climática, organizou em Bali para discutir
as medidas tomadas no Estado e no Brasil para mitigar emissões.


9 - Um ponto específico de caráter técnico, acompanhado pela
Petrobrás em Bali, foi a discussão sobre o seqüestro geológico do CO2,
sobre o qual a posição do Brasil, expressa pelo chefe do Grupo de
Mudança Global do MCT, José Miguez, é contrária à sua inclusão no
Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, mas favorável a estudos e
pesquisas nessa área.


10 - O Fórum realizou uma importante reunião em Bali com a
presença da ministra Marina Silva e do embaixador Sérgio Serra, além
de outros membros do governo, da qual participaram maciçamente pessoas
das ONG?s, de universidades e de empresas. Nesta reunião, diversas
críticas dos participantes foram abertamente discutidas e algumas
sugestões foram acolhidas pelos representantes do governo.


11 - Um ponto debatido na reunião do Fórum, além dos já
abordados acima, foi o do desmatamento, maior responsável pelas
emissões brasileiras. Houve dificuldade nas negociações na Conferência
neste ponto.


12 - O governo brasileiro defendia desde a Conferência
anterior, de Nairobi, um mecanismo para compensar financeiramente os
países que reduzirem seu desmatamento, como ocorreu no Brasil nos
últimos três anos. O desmatamento também é um grave problema na
Indonésia, país sede da Conferência. A Índia se colocou contra a
posição do Brasil, o qual se recusou a deixar a questão da preservação
da floresta a cargo do mercado internacional de carbono.


13 - O ministro Celso Amorim foi claro neste ponto na sua
coletiva à imprensa, enfatizando a necessidade de políticas públicas
dos governos nacionais contra o desmatamento. Ao fim, graças ao
esforço da delegação, especificamente das negociações feitas pelo
embaixador Everton Vargas e pela secretária de Mudança Climática do
MMA, Thelma Krugg, se chegou a um termo comum razoável na Conferência,
que ainda terá de ser trabalhado.


14- Em seguimento a Bali, deve-se cobrar no Brasil a
instalação da Comissão Interministerial, criada por ato do Presidente
da República pouco antes de Bali, para elaborar o Plano de Ação sobre
Mudança Climática, sugerido pelo Fórum.


15 - A lamentar em Bali foi a pouca importância dada na
Conferência em geral às advertências do IPCC.



Rio, Luiz Pingueli Rosa

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

São Paulo ganha Política Estadual de Educação Ambiental

O estado de São Paulo agora tem a sua Política Estadual de Educação Ambiental que, na prática, vai ajudar a organizar as estratégias de educação ambiental que forem organizadas no território paulista. A Lei Estadual 12.780/2007 (que você pode acessar pelo site da Assembléia, que institui a política, foi aprovada no começo de dezembro, com alguns vetos dos artigos considerados “insconstitucionais ou que ferem a autonomia dos poderes” (leia sobre os vetos no final da matéria).
A política conceitua a educação ambiental de maneira mais ampla, preocupada não apenas com o meio ambiente e a natureza, mas ligada à qualidade de vida e a questões sociais. No texto, a definição de EA engloba "os processos permanentes de aprendizagem e formação individual e coletiva para reflexão e construção de valores, saberes, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências, visando a melhoria da qualidade de vida e uma relação sustentável da sociedade humana com o ambiente que integra".
A lei de educação ambiental no estado reforça também o conceito de transversalidade na educação formal, orientando sua abordagem interdisciplinar e a exploração do tema nos diferentes graus do Ensino – reconhecendo que EA não deve ser uma disciplina específica, mas inserida no dia-a-dia da escola. E dispõe sobre a “educação através da comunicação” no artigo 7: cabe “aos meios de comunicação de massa de todos os setores promover, disseminar e democratizar as informações e a formação por meio da educomunicação, de maneira ativa e permanente na construção de práticas socioambientais”.
A educomunicação também entra no capítulo que se refere à educação não-formal, isto é, fora do ambiente escolar. No artigo 22, cabe ao poder público criar instrumentos para viabilizar, entre outros, “a promoção de ações educativas, por meio da comunicação, utilizando recursos midiáticos e tecnológicos em produções dos próprios educandos para informar, mobilizar e difundir a educação ambiental”..
O mais interessante nisso tudo é que o processo que culminou com a lei aconteceu fora da Assembléia Legislativa e movimentou a sociedade civil. A Rede Brasileira de Educação Ambiental, que envolve indivíduos e entidades que trabalham com EA, foi quem iniciou as discussões sobre o texto para uma lei sobre o tema no estado. Muitas dessas discussões foram feitas no mundo virtual, utilizando uma rede que funciona há alguns anos para discutir educação ambiental.
O texto foi ganhando corpo e, durante o III Encontro Estadual de Educação Ambiental, realizado no final de julho de 2007, em São José do Rio Preto (leia mais clicando no arquivo da revista Nova Escola), grupos de trabalho se reuniram para dar sugestões e amarrar a política final para ser enviada à Assembléia Legislativa. Vale lembrar que o Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema), que reúne governo e sociedade civil, deu total apoio à iniciativa e participou da elaboração do texto, assim como representantes diretos das secretarias Municipais de Educação e de Meio Ambiente.
E os vetos?
A Repea envia esta semana, ao secretário de meio ambiente Xico Graziano, uma carta de repúdio aos vetos da lei que instituiu a Política Estadual de Educação Ambiental. O que mais desagradou aos participantes da Repea foi o veto ao artigo que tratava da “obrigatoriedade da inclusão da educação ambiental como disciplina ou atividade curricular nos cursos superiores de licenciatura. Segundo a carta do grupo, esse esforço seria importante para avançar nas questões ambientais dentro da educação superior, o que posteriormente se reflete no ambiente escolar.
Também foi vetada a criação da CIEA – Comissão Interinstitucional de Educação Ambiental, que já existe no Paraná e no Distrito Federal. Essa comissão uniria esforços não só do governo estadual para promover ações de EA, mas também o governo federal e terceiro setor.
Apesar dos vetos (que poderão, a princípio, serem revistos), a votação recorde da lei é uma vitória. O texto da lei é objetivo, com uma proposta moderna para encarar a educação ambiental como parte inerente da cidadania. E para quem acha que “leis não servem para nada”, vale lembrar: leis legitimizam processos e conceitos, e a PEEA servirá para organizar – e incentivar – ainda mais a educação ambiental.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

História da Sustentabilidade

Leonardo Boff


Fonte: Jornal do Meio Ambiente - 28/11/07

A categoria sustentabilidade é central para a cosmovisão ecológica e, possivelmente, constitui um dos fundamentos do novo paradigma civilizatório que procura harmonizar ser humano, desenvolvimento e Terra entendida como Gaia. Comumente a sustentabilidade vem acoplada ao desenvolvimento. Oficialmente o conceito desenvolvimento sustentável foi usado pela primeira vez na Assembléia Geral das Nações Unidas em 1979. Foi assumido pelos governos e pelos organismos multilaterais a partir de 1987 quando, depois de quase mil dias de reuniões de especialistas convocados pela ONU sob a coordenação da primeira ministra da Noruega Gro Brundland se publicou o documento Nosso Futuro Comum. É lá que aparece a definição tornada clássica:"sustentá vel é o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades" .

Na verdade, o conceito possui uma pré-história de quase três séculos. Ele surgiu da percepção da escassez. As potencias coloniais e industriais européias desflorestaram vastamente seus territórios para alimentar com lenha a incipiente produção industrial e a construção de seus navios com os quais transportavam suas mercadorias e submetiam militarmente grande parte dos povos da Terra. Então surgiu a questão: como administrar a escassez? Carl von Carlowitz respondeu em 1713 com um tratado que vinha com o título latino de Sylvicultura Oeconomica. Ai ele usou a expressão nachhaltendes wirtschaften que traduzido significa: administração sustentável. Os ingleses traduziram por sustainable yield que quer dizer produção sustentável.

De imediato surgiu a questão, válida até os dias de hoje: como produzir sustentavelmente? Apresentavam- se para o autor quatro estratégias. A primeira era política: cabe ao poder público e não às empresas e aos consumidores regular a produção e o consumo e assim garantir a sustentabilidade em função do bem comum. A segunda era a colonial: para resolver a carência de sustentabilidade nacional impunha-se buscar os recursos faltantes fora, conquistando e colonizando outros paises e povos. A terceira era a liberal: o mercado aberto e o livre comércio vão regular a demanda e o consumo, resultando então a sustentabilidade que será melhor assegurada se for apoiada por unidades de produção nos paises onde há abundância de recursos necessários para a produção. A quarta era técnica: para superar a escassez e garantir a sustentabilidade buscar-se-á a inovação tecnológica ou a substituição dos recurso escassos: em vez de madeira usar carvão e mais tarde, em vez de carvão, o petróleo.

Hoje com a distância temporal podemos dizer: se houvesse triunfado a estratégia política em razão do bem comum, a história econômica e social do Ocidente e do mundo teria seguido o caminho da sustentabilidade. Haveria seguramente mais eqüidade (os custos e os benefícios seriam mais igualmente distribuidos) , viver-se-ia melhor com menos e havera mais preservação dos ecossistemas.

Mas não foi este o caminho escolhido. Foi o do colonialismo, do imperialismo, do globalismo ecômico-financeiro e da economia política de mercado que gerou a grande transformação (Polanyi) com a mercantilizaçã o de todas as coisas e o submetimento da política e da ética à economia. A crise ecológica atual deriva deste percurso que, mantido, poderá ameaçar o futuro da vida humana. Agora é tempo de revisões e de buscas de alternativas paradigmáticas.

Leonardo Boff - Teólogo